Posicionamento Estratégico na Pequena Empresa
- Renê Ruggeri
- há 12 minutos
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Todos já viram empresas exibirem suas missões com orgulho em eventos empresariais e mensagens publicitárias. Algumas missões parecem mesmo terem sido criadas apenas para publicidade. Mas não deve ser assim. A missão de uma empresa é um importante balizador para a tomada de decisões, assim como outros elementos do posicionamento estratégico da organização. Isso vale para grandes empresas e muito mais para as pequenas.
Enquanto as grandes empresas têm alternativas diversas de caminhos a seguir para seus objetivos e precisam do balizamento estratégico para tomar as melhores decisões, as pequenas precisam dele exatamente para não tomar caminhos equivocados que se apresentam a todo instante. É o posicionamento estratégico que fornece a bússola para a tomada de boas decisões, ou seja, aquelas que conduzem a empresa aos seus objetivos, ou à sua realização.
É certo que nas pequenas empresas, a influência das características pessoais dos líderes (normalmente os sócios) no posicionamento estratégico é bem forte, o que reforça a tese de que ter claro esse posicionamento é fundamental até mesmo para separar o que é objetivo pessoal dos sócios e o que deve ser objetivo da empresa.
E tudo começa antes mesmo da missão. Há uma questão existencial que precisa ser respondida preliminarmente: por que a empresa existe?

Pequenas empresas muitas vezes são criadas por uma questão de subsistência do criador. Não há um plano de criação sustentado por desejos de realização de algo, mas uma oportunidade que foi agarrada para gerar renda. Estas empresas, mais cedo ou mais tarde, precisarão se reinventar e descobrir uma razão pela qual possam justificar sua existência. Gerar lucros raramente é uma questão existencial, mas uma questão “subsistencial”.
Responder por que uma empresa existe é exprimir o seu propósito, aquilo que deve mover todo o organismo empresarial. Uma pessoa precisa ter um motivo ou uma inspiração para levantar-se da cama pela manhã; uma empresa deve ter um motivo ou uma inspiração para abrir as portas todos os dias. Este motivo ou inspiração não precisa ser algo elevado apenas em termos morais, mas deve ter uma forte sustentação ética, alinhada com valores que sejam socialmente responsáveis e coerentes com a realidade do negócio.
O palhaço se pinta para levar momentos de alegria às pessoas, o cirurgião se veste para salvar vidas em estado limite de sobrevivência. Ambos são igualmente aceitos pela sociedade, e sua excelência será percebida subliminarmente pela forma de fazerem o que fazem. Aliás, excelência diz respeito exatamente a atingir o estado da arte em alguma coisa. É excelente aquele que vive pelo seu propósito e, por isso, se aplica à sua realização.
Reconhecido um propósito, pode-se definir como se pretende concretizá-lo, com que ações. Aí está a missão, a forma prática escolhida para realizar o propósito. O palhaço pode optar pelo circo, pelo teatro, pela escrita etc., conforme suas habilidades e traços de personalidade. O médico pode optar pelos centros de pesquisa avançada, pelo pronto-socorro urbano, pela assistência em locais remotos, pelo plantão em zonas de guerra. Cada pessoa tem uma forma de cultivar seu propósito e cada empresa também terá a sua.
Um propósito e a missão derivada dele têm valores diferentes para a pessoa e para a sociedade, o que se aplica também a empresas. Como o propósito é a razão de existir de uma empresa, ele tem altíssimo valor para ela. Mas, eventualmente, a sociedade, embora o reconheça, não tem nele algo de alto valor econômico imediato. O reconhecimento econômico da missão ou propósito pode parecer desproporcional, mas não é fixo. O que hoje recebe pouco reconhecimento da sociedade pode conquistar melhor status, ou o contrário.
Mas um propósito pode derivar várias missões que o concretizem em alguma medida. Algumas delas podem despertar maior reconhecimento econômico. Escolher uma missão que concretize algo que faça a empresa abrir as portas é fundamental. Veja que a missão é escolhida estrategicamente, mas o propósito é algo mais intrínseco, muitas vezes genuinamente descoberto a partir de um trabalho de autoconhecimento (pessoal ou empresarial, o que é bem próximo nas pequenas empresas).
Descoberto o propósito e definida uma forma de concretizá-lo, a missão, é preciso estabelecer uma diretriz para construir um plano de ação, afinal a missão não se realiza por passe de mágica e o propósito deve estar sustentado por valores e princípios éticos que o fortaleçam e garantam sua legitimidade perante a sociedade.
Aliás, essa é uma constatação importante: se o propósito for algo finito, uma vez realizado não há mais razão para existir. Veja por que o propósito deve ser algo inspiracional, ou seja, realizável, compreensível, mas inesgotável. A missão pode até ser complexa e ampla, mas finita, pois pode ser modificada com base no mesmo propósito.
A diretriz sob a qual se planejará a realização de uma missão é o que podemos chamar no posicionamento estratégico de visão. A visão é uma resposta à questão: aonde queremos chegar, ou que posição queremos ocupar, na realização da missão que concretiza o propósito? Veja que a visão é uma meta de longo prazo, uma espécie de destino, uma visão de futuro.
Por ser bem mais prática e perceptível que a missão e o propósito, a visão tem uma capacidade maior de atingir pessoas, conquistando sua adesão ao posicionamento estratégico da empresa. A visão é o gatilho do engajamento das pessoas. As pessoas têm propósitos diferentes, missões diferentes, mas uma mesma visão pode estar no radar de várias pessoas, ou permitir que percebam naquele destino algo aderente à sua própria visão pessoal.
O mundo não é exatamente como queremos que seja a todo momento, logo, todos precisamos ser flexíveis para achar nossos próprios caminhos em meio aos caminhos de todos. Isso vale para pessoas e empresas. A conjuntura se mostra e precisamos achar os caminhos para buscar nossa visão, concretizando nossa missão e realizando nosso propósito.
Trilhar esse caminho demanda planejar a trajetória e todos os aspectos que a caracterizam. Para chegar a uma visão destino é preciso estabelecer os pontos que marcam a trajetória até ela. Isso significa estabelecer objetivos e metas. São resultados que precisam ser entregues e que, ao irem se agregando, constroem a trajetória para a visão. Atingir a visão é o que se pode chamar, em termos práticos, de sucesso. À medida que a visão se realiza, a missão vai sendo cumprida.
Mas o segredo não é atingir todas as visões possíveis, nem cumprir todas as missões possíveis. Se objetivos, visão e missão estão alinhados com o propósito, o motivo para sair da cama ou abrir as portas já está dado. No mais, o sucesso é a plenitude de sentir que o caminho escolhido está sendo trilhado com a validação e valoração da sociedade que, por fim, é o único destinatário de qualquer existência.
A validação social é um componente essencial do sucesso empresarial, pois reconhece na empresa sua responsabilidade ética, impacto social positivo e sustentabilidade. Isso a mantem relevante e garante sua longevidade. O sucesso medido em termos meramente econômicos ou financeiros não se sustenta, já sua abordagem também em termos sociais e ambientais gera confiança e engajamento. Ou em outras palavras, gera visibilidade e contratos.
O segredo começa, então, na descoberta do propósito, o que, na pequena empresa, mais que uma manifestação da cultura organizacional, é uma manifestação da essência dos sócios, produto do autoconhecimento e de uma certa perspicácia existencial e ética.
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