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Foto do escritorRenê Ruggeri

De grão em grão a galinha enche o papo e põe um ovo de ouro (Otimizações em Projetos)

Vira e mexe conto em alguma conversa algum caso de melhoria que fizemos em algum projeto de empreendimento que redundou em grandes economias. Mas, em geral, não conto muito os casos em que pequenas economias foram feitas, pois isoladamente não chamam a atenção. Mas, deveriam.


Um bom projetista encontra pequenas melhorias a serem feitas na concepção das soluções técnicas, aqui e ali, à medida que o projeto amadurece. São melhorias de trajetos em tubulações, pequenas melhorias em layouts, finos ajustes dimensionais na compartimentação, pequenas padronizações em  armaduras ou formas de estruturas, ponderações mais rigorosas num dimensionamento de circuito elétrico etc. Todas são pequenas melhorias que isoladamente pouco significam a não ser pelo capricho do projetista (que deve ser exaltado, claro).


Nas minhas equipes sou insistente em buscar essas possíveis melhorias. Ajustes de layout na Arquitetura de Interiores, uma especificação mais rigorosa num acabamento, uma avaliação de modelos alternativos de esquadrias na Arquitetura Predial, uma análise dimensional de elementos estruturais de concreto em busca de aproveitamento de formas e vários pequenos ajustes em instalações diversas.


Repito incansavelmente que o bom projeto tem 10% de inspiração e 90% de transpiração. A transpiração inclui essa busca incessante por otimizações que, não raras vezes, podem estar nas interfaces entre as disciplinas técnicas. E assim, de grão em grão, a galinha enche o papo. Mas qual a grande vantagem disso, além dos pequenos ganhos, claro?


A questão é simples. Isoladamente nenhum desses pequenos ganhos é realmente significativo, mas em conjunto podem até representar alguma coisa. E isso pode fazer a diferença. Quer ver?


Todo empreendimento inicia com base numa expectativa de custo. Se for uma construção para venda, como é o caso da incorporação imobiliária, há também uma expectativa de preço de venda. O custo é ditado pelo projeto e planejamento. O preço é definido com base no valor que o mercado perceberá no empreendimento. Mas o segredo é o retorno, ou lucro, que o empreendimento proporciona que, evidentemente, decorre da diferença entre o preço e o custo.


As pequenas melhorias podem até não reduzir o custo significativamente, mas serem suficientes para agregar ao empreendimento, algo que é muito valorizado pelo mercado, o que aumenta o preço de venda. Um recurso estético, um acabamento cobiçado, uma automação pontual, enfim, qualquer item que o mercado perceba com alto valor.


Assim, a redução do custo deixa de ser a bola da vez, cedendo lugar à oportunidade de elevação do preço, o que é também uma forma de melhoria para o empreendimento.


Vamos colocar números que, embora fictícios, não são muito diferentes das possibilidades.


Digamos que as pequenas reduções de custos somam cerca de 5% do valor da obra. Aplicando estes 5% do valor da obra em itens valorizados pelo mercado, pode-se, por exemplo, obter um acréscimo de até 5% do preço de venda. Ou seja, ganha-se 5% a mais no retorno esperado inicialmente (já que o custo se manteve). Se este retorno era (grosseiramente) de 10% do preço de venda, temos um ganho de 50% sobre o lucro. A conta é um tanto mais complexa, mas a ideia é exatamente a que apresentamos: é possível que pequenas economias financiem alternativas de grande valor agregado.


Isso é o que chamo de um ovo de prata. Mas há um caso ainda mais vantajoso.

Não é incomum que a equipe de projeto, ao se esforçar em busca de melhorias, encontre soluções que geram mais percepção de valor podendo reduzir o custo da obra ou mesmo mantê-lo no patamar inicial. Nestes casos não é preciso agregar nada ao empreendimento, pois a própria solução encontrada se encarrega da agregação de valor.


Por exemplo, uma orientação geográfica mais apropriada para um edifício pode melhorar a vista a partir das janelas, ou melhorar a ventilação, insolação etc. Veja que esta solução pouco afeta qualquer característica construtiva, mas agrega valor ao empreendimento.


Outro exemplo, seria o compartilhamento de espaços e suportes para sistemas prediais que normalmente seriam completamente independentes. Inevitavelmente há redução de custo, mas a grande vantagem pode ser a facilidade de execução e manutenção.


Essas soluções estão na sutileza da integração e concetos das soluções técnicas e, para que sejam mais perceptíveis pelo público leigo, precisam ser evidenciadas, destacadas objetivamente. Aí está o papel do marketing e dos corretores (no caso da incorporação). Assim, a percepção de valor recebe os incrementos adequados, para que o valor seja atribuído e o retorno/lucro, obtido.


Digamos que as várias otimizações realizadas no empreendimento permitam uma percepção de valor 5% maior e um custo 5% menor. Neste caso, temos um ganho de 10% no retorno, ou seja, um incremento de 100% do retorno previsto (considerando que seja previsto em 10% como antes).


Cabe aqui ressaltar que essas economias e ganhos na faixa de 5% são plenamente factíveis. Há casos em que se consegue bem mais que isso apenas otimizando soluções concebidas inicialmente.


Agora sim, dobrando o retorno/lucro, podemos dizer que temos um ovo de ouro. E quem põe esse ovo é a equipe de projeto, mas não sem esforço, claro.


Uma última análise precisa ser feita: onde achar essa galinha dos ovos de ouro? Leia-se: onde encontrar uma equipe de projeto que otimize sistematicamente as soluções técnicas de forma a agregar valor ao empreendimento?


É claro que não é fácil atingir esse nível de colaboração nos projetos e planejamento de Arquitetura e Engenharia. Precisamos de uma equipe multidisciplinar. E mais, desde o início do processo de desenvolvimento do projeto, pois as otimizações são mais oportunas e eficientes nas etapas iniciais.


Contudo, não é difícil perceber que o mercado mobiliza tardiamente diversos especialistas e, por isso, perde diversas oportunidades de ganhos. O mais engraçado é que este costume é justificado, quase sempre, com base em economia, sob o argumento de que investir “demais” em projetos no início gera custo, quando na realidade gera ganhos.


Nunca é demais destacar que o custo dos projetos é da ordem de 5% do valor da obra (quando é muito bem pago, no mercado atual). Economiza-se uma parcela destes 5%, digamos 2,5%, e perde-se a oportunidade de ganhar até 10% do custo da obra em retorno adicional. Se colocarmos, como deve ser, os custos operacionais e de manutenção nesta conta, os ganhos podem ficar assustadoramente superiores, já que 70% do custo de um empreendimento ocorre durante seu uso ao longo das décadas.


Poderíamos pensar num ovo de platina, mas em geral o mercado consome ovos comuns de galinhas que cacarejam bastante. Como raramente se vê um ovo de ouro, dificilmente se reconhece a galinha dos ovos de ouro. Aliás, na falta de ovos, o mercado consome a galinha.

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